Pagode ganha força no interior de SP e valoriza cultura negra; veja como artistas celebram o ritmo

  • 20/11/2025
(Foto: Reprodução)
Dia da Consciência Negra celebra a história do pagode na cultura brasileira "Um sorriso negro, um abraço negro… negro é a raiz da liberdade." É com os versos eternizados por Dona Ivone Lara que Débora Guimarães, conhecida como Deboo, inicia suas rodas de pagode em Bauru, no interior de São Paulo. O canto abre caminho para uma noite em que ancestralidade, resistência e celebração dividem o mesmo palco. 📲 Participe do canal do g1 Bauru e Marília no WhatsApp Há cinco anos, a vida da cantora mudou quando ela passou a se dedicar exclusivamente à música. A 'liberdade' para fazer essa escolha só veio a partir da retomada do ritmo como tendência musical. Atualmente, segundo dados da Pro-Música Brasil, o pagode é o gênero musical mais ouvido no Brasil. "Deboo" vive há cinco anos de pagode e se inspira em artistas negros Mesmo em 'território sertanejo', culturalmente ligado às raízes do interior do país, Deboo tem conseguido espaço com o pagode, gênero musical que remete à sua ancestralidade negra. E é valorizando a obra de artistas negros, do samba e do pagode, que a cantora tem encontrado sucesso no centro-oeste paulista. "As minhas referências de música são pessoas pretas: Reinaldo, Alcione, Jovelina Pérola Negra, dentre outras. É um leque de artistas negros que me incentivam", comenta. Débora Guimarães se apresenta em bares e festas de Bauru e região Reprodução/TV TEM No grupo em que se apresenta, composto por sete integrantes, Deboo é a única mulher. A posição, ainda rara no universo do pagode, faz com que ela enxergue sua presença como parte de uma luta maior. "As mulheres vão dominar o mundo, isso a gente já sabe, só leva um tempo de construção. Na minha área, a gente ainda sofre muito machismo... Por ser mulher, a gente tem que provar duas vezes mais que é capaz de estar ocupando esse espaço, e a gente é muito capaz. Quanto mais mulheres entrando na cena, melhor ainda", conta. "Quando é uma mulher que está tocando, é um ambiente diferente, porque eu acho que as mulheres se sentem mais confortáveis de estar em uma roda de pagode. Pra mim, é um ambiente mais acolhedor. E ver uma mulher preta em um cenário muito machista ainda, é muito importante", diz Sarah Gomes, jornalista e membro do fã clube da cantora. Fã clube da cantora acompanha Deboo nos shows em Bauru e região Reprodução/TV TEM A boa recepção aparece tanto nas redes quanto nas casas onde Deboo se apresenta. No bar onde sobe ao palco todas as segundas-feiras, o gerente confirma que o pagode tem impulsionado o movimento e ampliado os lucros. "O público sempre pede mais", afirma. Bom momento do pagode é comemorado por dono de bar em Bauru "Segunda-feira é um dia difícil. A gente pensou no gênero que mais atrai pessoas aqui para o bar, e a gente fechou essa parceria maravilhosa com a Deboo, e tem surtido frutos positivos", comenta Thiago Della Barba, proprietário do bar, localizado na Avenida Getúlio Vargas, área nobre de Bauru. Deboo não está sozinha na "cena". Diony Carlos, do grupo Coisa e Tals, também de Bauru, diz que o momento é de ascensão, mas lembra que o sucesso atual só existe graças aos sambistas que, décadas antes, enfrentaram preconceito e criminalização. Pagodeiros do interior de SP se espelham nos sambistas do século passado "Pagode é um ritmo que leva bastante energia. As músicas de matriz africana, consequentemente, levam muita energia. Eu acho que a galera que faz o samba que trouxe isso para a gente. A galera lá de trás, Arlindo Cruz, Jorge Aragão, trouxe essa energia e a gente continua transmitindo", conta. "Se não fossem eles, a gente nem estaria aqui. A verdade é essa. Graças ao que eles fizeram lá atrás, a gente consegue executar hoje, tanto algum instrumento ou algum arranjo nas músicas", complementa. Grupo Coisa e Tals se apresenta em bares e festas, em Bauru (SP) Reprodução/TV Tem Símbolo de resistência Para entender o pagode, é preciso voltar no tempo. A palavra não nasceu para batizar um gênero musical, mas, sim, para nomear as festas realizadas nas senzalas e quilombos. Segundo a pesquisadora da Universidade de São Paulo (USP) Karina Sousa, o pagode está intimamente ligado à construção da identidade do povo recém-liberto da escravidão, que fazia da música e da dança seu espaço de expressão e coletividade. Pesquisadora da USP explica origem do termo pagode "A palavra pagode está presente na lingua portuguesa desde o século 16. Nesse primeiro momento, ela, de fato, vai significar 'festa ruidosa' e vai designar esses festejos da população negra escravizada", explica. A partir do início do século 20, o termo passou a ser usado para nomear as festas que reuniam samba, canto e bebida. Com o tempo, virou praticamente sinônimo do próprio samba, especialmente nos subúrbios cariocas. Foi somente na década de 1980, com o grupo Fundo de Quintal, que o pagode ganhou uma sonoridade própria, mesclando ritmos de matriz africana com instrumentos como banjo, cavaquinho, surdo e tantã, criando um estilo novo dentro da tradição. "Esse gênero pagode só vai ganhar o Brasil a partir de 1985, com uma coletânea que se chama 'Raça Brasileira'. Nesse vinil, vai ter Zeca Pagodinho, Jovelina Pérola Negra, entre outros sambistas de sucesso", comenta a pesquisadora. Fundo de Quintal (Bira Presidente com pandeiro na mão) durante o 'Planeta Xuxa', da TV Globo Arley Alves/TV Globo 'Pagode dos anos 90': o boom que moldou gerações Grupos numerosos, jovens negros, letras românticas, elementos eletrônicos e coreografias inspiradas em boy bands marcaram o chamado pagode dos anos 1990, que embalou festas por todo o país e, hoje, vive um processo de redescoberta. De acordo com a Pro-Música Brasil, o gênero liderou as reproduções no primeiro semestre deste ano, e muitos dos sucessos atuais são regravações ou homenagens àquele período. Rodriguinho, ex-vocalista de Os Travessos e nascido em Bauru, diz que ainda estranha a dimensão atual do pagode, mas celebra o crescimento do gênero. Rodriguinho, nascido em Bauru, era vocalista do grupo Os Travessos Arquivo pessoal "Quem viveu aquela época estranha o que está acontecendo hoje. Eu sou um desses caras. Porém, mesmo estranhando, acho fantástica a dimensão que o samba tomou. Hoje, no Brasil, é o ritmo mais escutado e o que mais traz lucro para as festas", afirma. Cantor Rodriguinho comenta retorno do pagode às paradas de sucessos Para o pesquisador da USP Igor Graciano Damião, o pagode dos anos 1990 representou mais do que uma mudança sonora: marcou a valorização da identidade negra ao ocupar as mídias de massa, como rádio, televisão e revistas. "Eu acho que a diferença da musicalidade do Fundo de Quintal, do Zeca Pagodinho, Almir Guineto, Jorge Aragão para os grupos de pagode da década 1990 são principalmente a inserção de três instrumentos: bateria, contrabaixo elétrico e sintetizadores, teclados. Usava-se isso também em, por exemplo, em Jorge Aragão, na década de 1980. Mas eu acredito na estética musical do pagode dos anos 1990. Isso foi usado de forma mais assertiva. Não melhor ou pior, mas talvez um pouco mais coesa", explica. Grupo de pagode Karametade fez sucesso nos anos 90 e segue na ativa, com formação menor Reprodução "Outra questão de suma importância são as narrativas. Narrativas que falam de amor, a possibilidade de uma população negra se amar, de uma juventude negra, homens e mulheres pretas se amando. Essa descrição, sobretudo de uma juventude que ouve isso na televisão, no domingo à tarde, essas narrativas de amor, extremamento poéticas, subjetivas, cheias de metáforas... poesia. Eu acho que a juventude ouvindo essa sonoridade trouxe na cabeça de pessoas como eu a possibilidade do sonho", complementa o pesquisador. Pesquisador da USP ressalta importância do pagode para construção da identidade negra Rodriguinho lembra como a presença de tantos grupos formados por jovens negros impactou sua própria trajetória. "O pagode mudou a minha vida. Existe um Rodriguinho antes e um Rodriguinho depois do pagode. Naquela época, foi um período muito importante. Inclusive, eu vi uma entrevista do Thiaguinho (cantor), e ele dizia que era um dos poucos negros da escola dele, porque era uma escola particular. E ele diz que estava na escola e viu, uma vez, uma menina pegando uma foto minha e falando: 'Nossa, esse Rodriguinho é lindo'. Quando ele ouviu aquela menina falando isso, ele: 'Mano, se ela gosta do Rodriguinho, ela pode gostar de mim'. Eu acho que foi isso que representou. A ascensão do pagode naquela época deu voz para a maioria dos negros do Brasil. Entenderam que poderiam chegar, que poderiam ser respeitados", pontua. Cantor Rodriguinho diz que pagode mudou a vida dele e de jovens negros na década de 90 Para Rodriguinho, independentemente da retomada do pagode no topo das paradas, sendo sinônimo de sucesso comercial, o ritmo jamais perderá suas raízes. Rodriguinho diz que pagode é cultura popular e símbolo do povo negro "O pagode é da rua, é do povo. Embora esteja em todos os lugares, ele é do povo. A gente pode não estar nas televisões, em lugar nenhum, mas a gente vai estar existindo e vai estar tocando mesmo, e vai ter gente sambando, cantando", afirma. Veja mais notícias da região no g1 Bauru e Marília VÍDEOS: assista às reportagens da região

FONTE: https://g1.globo.com/sp/bauru-marilia/noticia/2025/11/20/pagode-ganha-forca-no-interior-de-sp-e-valoriza-cultura-negra-veja-como-artistas-celebram-o-ritmo.ghtml


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